O uso das fontes e o dever de checar as informações
O texto abaixo
reproduz uma publicação de hoje, 22 de junho de 2020, da jornalista e professora
Sylvia Motetzsohn. Vale a pena conferir o relato e o questionamento dela, bem
como a checagem realizada pela agêngia Aos Fatos. Ela pode ser acessada no link a seguir.
Boa leitura!
"Hospitais
brasileiros estão a registar como óbitos por Covid pessoas que não morreram de
Covid. Em causa parecem estar subsídios dados pelo governo federal às Câmaras e
aos governos estaduais por cada vítima do novo coronavírus".
Foi o que anunciou a âncora do Jornal do Meio-Dia, da RTP3.
Uma bomba, pois não? Lançada assim, como quem pisa nos
astros, distraído.
Na sequência, o correspondente no Rio reiterava:
“É cada vez maior o número de mortos por covid 19 que não
corresponde à verdade".
E seguia com matéria sobre o enterro de um homem, Altair do
Carmo, que, segundo um parente, morreu de "choque séptico, pneumonia e
suspeita de Covid". O parente sublinha essa informação sobre a
"suspeita de Covid" e diz: "Fomos informados que é protocolo do
hospital botar suspeita de Covid".
Volta o repórter:
"A RTP confirmou junto de fonte oficial (não diz de que
nível, se federal, estadual ou municipal) que por cada vítima mortal de Covid
19 os governos estaduais e as câmaras municipais no Brasil recebem uma verba de
emergência do estado federal. Para o genro de Altair do Carmo tudo não passa de
um aproveitamento vergonhoso de uma pandemia que se transformou numa guerra
política". E volta a dar voz ao entrevistado.
Faço esse relato pormenorizado, com a transcrição das frases,
para mostrar o grau de irresponsabilidade a que pode chegar esse jornalismo.
Quero recordar que esse tipo de suspeita (ou mesmo denúncia,
afirmativa como foi o texto da matéria) existe desde que a pandemia começou a
atingir o Brasil, em março. Era parte da estratégia de Bolsonaro para minimizar
a gravidade da situação e atacar os governadores que tentavam tomar medidas
preventivas. Foi, inclusive, desmentida pela agência Aos Fatos há mais de um
mês, em 19 de março (reproduzo o link nos comentários).
O correspondente não sabia disso?
Fui verificar se a mesma matéria constava do noticiário do
canal 1. Pelo menos no Jornal da Tarde, não: pelo contrário, o locutor em off
exaltava o trabalho do grupo de empresas jornalísticas brasileiras que estavam
buscando as informações verdadeiras diante da tentativa do governo federal de
escondê-las. Dizia: "É graças a esse grupo de imprensa que neste momento
sabemos com credibilidade que o Brasil registou mais (xis) mortos e infectados"
etc.
Nenhuma palavra sobre a tal fraude no registro de óbitos.
O que é que tem credibilidade? O consórcio de imprensa,
segundo o canal 1, ou a tal fonte oficial que o correspondente consultou, junto
com o parente "indignado" da vítima, segundo o canal 3?
Enviei reclamação ao provedor do telespectador, porque é
mesmo um escândalo.
Mas acho também necessário deixar essa nota aqui [no Facebook].
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